Uma coisa do freak do Caeiro que deve ser tomada como referência para os que gozam de ser Portugas.

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no Universo ... por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer, porque eu sou do tamanho do que vejo e não do tamanho da minha altura ...

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

A ilustre amiga vitalícia, a EM

Falo-vos da minha nova amiga, Esclerose Múltipla. Há um ano e tal que a conheço de perto e creio que vou ser sempre amigo dela, até ao fim dos meus dias.

Nunca escrevi nem nada manifestei acerca desta nova amiga. Não é que me apeteça falar muito dela, até porque tem pinta de puta cobradora, mas tem que ser.

Eu tenho-a como amiguita, não sou eu que a sinto e lhe complico a vida mas sou amigo dela através da minha mulher. Coisas. Agora, partilhamos tudo. É assim, tem que ser assim, de outra maneira não sei fazer as coisas. Já que chegou sem avisar, quero estar a acompanhá-la, bem de perto, para ver o que faz.

Eu conto-vos. No dia 16 de Julho de 2006, no dia a seguir a termos mudado de casa, para a que sempre sonhámos ter, com um quintalinho para os cães e para fazermos uns churrascos e aquelas coisas todas que gramamos fazer ao ar livre, pois bem; de manhã, quando me levantei para continuar com as arrumações dos móveis e afins, a minha mulher queixou-se de uma dormência nas mãos e uma forte dor nas costas, todos associámos aquele sintoma ao esforço despendido nas mudanças, pelo que não moveu nem mais uma palha; no dia a seguir a dor transformou-se em dormência de braço, depois do antebraço e depois das pernas. Como estúpidos humanóides que somos, concluímos superior e doutamente que fora um mau jeito na coluna e fomos ao médico.

Após a conversa e rápido diagnóstico precoce, seguiu-se uma consulta de urgência na CUF Descobertas, um catrefada de exames e mais uma punção lombar e eis que no dia 25 de Julho de 2006 nos chega pela fresquinha, eram umas nove e pouco da manhã, o tão esperado resultado das análises. A notícia apareceu como se tivéssemos levado um tiro vindo de onde menos esperamos, completamente indefesos, caiu que nem um trovão em dia de calor tórrido ... a notícia caiu inoportuna mas com grande impacto, como tudo o que não é bom. Foi o caos nas nossas cabecitas.

Não conhecíamos de perto nem de longe a amiga EM e começámos logo a divagar e a entrar em órbita e sem máscara com as causas do aparecimento da nova personalidade. Seguiram-se os ataques de pânico quando a moça aparecia ou se vislumbrava que iria chegar a qualquer momento, o INEM já era nosso parceiro quase de cartas, as visitas ao hospital tornaram-se uma quasi-rotina, até que se conseguiu controlar a convivência com a nova amiguita e, injecção após injecção, comprimidito após comprimidito, lá nos fomos capacitando que a moça tinha vindo para ficar.

Restava-nos saber conviver com mais isto, mais uma boca para alimentar, o que nos obrigou a desistir desde logo de um leque de vontades e inúmeros desejos que auspiciávamos vir a conseguir cumprir, e rápido.

Esta nova amiga é, esquisita, leviana, desconcertante, gulosa nas grajeias que lhe damos, habitua-se rápido a drogas injectáveis, gosta de fazer as coisas com as horas e os dias marcados, não gosta nadinha de stress, de nada que a possa enervar, as papinhas que ela gosta têm que ser especiais, nem muito nem pouco sal, nada de porcarias picantes e coisas com temperos esquisitos, bebidas alcoólicas e café ... nem pensar, enfim, aparece-nos uma mocita toda esquisita, cheia de tretas e "ai não bebo que me faz mal e não-sei-quê" e ainda por cima nem sequer a convidámos e agora temos que gramar com as presuncices da menina, nem mais, e para sempre. Embrulha que é prenda armadilhada.

No entanto, convém dizer que esta rapariguita já era mais ou menos nossa amiga. Apresentou-se já há uns anos atrás, aí em 2001, mas de uma forma normal, como se apresenta a muita gente. Ah e tal, pimba ... prega-nos uns valentes cagaços e espeta-nos com umas falhas de visão, um ambliopismo estúpido, cansaço rápido e ... como normalmente ela aparece em alturas de grande esforço psíquico e físico, ou de stress fora do normal, a malta pensa logo "estou em exames e deve ser do cansaço, vou mas é mamar uns calmantes e uns anti-depressivos e isto passa", e passa, só que a nova amiga ainda não se deixou mostrar por completo. Nesta fase só nos avisou que iria aparecer e viver connosco para sempre. Quando, não o sabíamos.

Ou então a malta já a conhece de ginjeira quando já é amiga da família há gerações e sabemos que temos que levar com as teimosias dela. Aí já vivemos preparados e em sintonia.

Está na altura de vos tentar dizer como é que é o dia-a-dia com as duas mulheres que vivem e convivem comigo ao mesmo tempo. Complicado, rápido e fácil de entender. Digo-vos que uma delas, a amiga EM, nem a vejo, mas sinto-a como se fosse real, é teimoooosa!! Mas fácil de aturar, no meu, digo, no nosso caso, é assim, até agora tem sido fácil lidar com a situação.

Contudo, e variando de pessoa para pessoa, a convivência com a amiga EM oscila bastante; desde a quase não aparência de se estar com alguém até a simples dedução que estamos sempre dependentes de outra coisa, neste caso, da amiga EM.

Muito se pode dizer e escrever sobre o comportamento das pessoas que travam conhecimento de perto com a famosa EM, mas cada caso é um caso e a única coisa em comum é que a EMezita nunca mais nos abandona, é como o Toyota, veio para ficar, portanto, aguentemo-nos à bronca.

Mas há um truque, cujo segredo é difícil de conseguir descobrir, para alguns, mas quando se consegue, acreditem, é bem fácil de lidar com quem não convidámos para viver connosco. Eu explico.

Da parte da pessoa com quem a amiga inesperada escolheu para viver lado-a-lado, o segredo está em tentar fazer ao máximo as coisas que mais agradam à nova visita, isto é, tentar pôr de parte tudo aquilo que ela não gosta e não suporta, coisas más. E perguntam-me com todo o direito, o que é que temos que fazer? Pôr de parte, o que é que é preciso fazer para estar bem com ela? Pois se se encontrou o segredo da boa convivência com essa intrometida, a malta faz tudo, o que é preciso fazer??!!

O que vos posso dizer é que a EM não é tão exigente como ela se quer fazer parecer, antes pelo contrário (aqui está o segredo para a boa convivência com ela), a EM gosta de boas coisas, não de coisas boas, eu disse BOAS COISAS, de coisas sãs, de boas comidinhas, boas e saudáveis, de um bom vinhinho de vez em quando, mas do muito bom, de muito mas muito pouco sol, pois isto só lhe faz mal à pele, nada de preocupações ou então só umas, mas muito pecaninas assim mesmo pecaninas, daquelas que nos fazem manter vivos, gosta de muito apoio e companhia, de compreensão e paciência. A EM gosta principalmente de desafios, de fazer o que sempre quisemos fazer, com mais esforço certo está, mas ela gosta que o façamos na mesma, gosta que descubramos novas formas de fazer as coisas que sempre fizemos, só que com mais qualidade, a EM aprecia as pessoas que traçaram objectivos, seja em que altura tenham sido delineados, gosta que sejam cumpridos ou pelo menos que tentem alcançá-los. O que a amiga EMezita detesta mesmo, é de prostração, de desistências, de não acalentar novos desafios, de perdedores, de fracos de espírito, ela odeia estas coisas, e quando isto lhe aparece pela frente, ela consome-nos a cabeça, enfaralha-nos o sistema nervoso e prega-nos umas fintas de tal maneira que mais parecemos toureados pelo Chibanga, ficamos de rastos e não sabemos porquê; simples, porque estamos a fazer o que ela NÃO gosta.

Este é o segredo para que o truque da boa convivência com a EM funcione. Temos que ser fortes e consegui-lo manter bem guardado, connosco e com quem partilhamos a nova amiga, com a família. Depois, temos sempre os nossos amigos com quem partilhamos as novidades trazidas pela nova amiga, Temos também os incansáveis amigos dos hospitais que nos ajudam sempre que precisamos, mas o principal, o principal é saber manter o segredo do truque e fazer com que a nossa EM ande feliz, basta só fazermos coisas boas a nós, basta olharmos para nós como já não olhamos há muitos anos e a amizade inesperada supera-se com o tempo, acreditem.

É duro, mas acreditem, os laços entre as pessoas reforçam-se e a cumplicidade aumenta. Comigo é assim, quero que seja assim. 'bora prá farra. Há toda uma Nova Vida a descobrir, e com qualidade, se quisermos.

(à minha mulher, à minha Ana)
Abreijos

20 comentários:

  1. Claro que acredito e bem sei que é assim. Sei que não tem sido fácil para nenhum dos dois, e se numa primeira fase, me perguntei "Porquê eles, meu Deus? Eles não merecem" Por outro lado, sempre soube que Deus dá as maiores provações aos filhos de quem mais gosta, pois sabe que são os únicos capazes de viverem com causas dificeis sem terem que encontrar bodes expiatórias para as raivas inerentes...Beijos!

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  2. Tudo verdade, mas bem que podia ser mais diferente, acredita que podia.
    E se assim é, carreguemos a coisa ao colo e façamos dela o que nos apetece, nunca o contrário.

    Thanks.

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  3. Fiquei sem words ... claro que fiquei ... porque o sr.gajo criador deu-te as palavrinhas todas ... e certas ainda por cima ... pq há mt bacano que debita mt palavra e a ordem delas esta td marada ...
    Isto td para nao falar do mais importante, nestes momentos só se pode dizer, o que eu poder fazer amigao, manda Fred.

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  4. Grande Abelha, obrigado Amigo.

    De momento está tudo controlado, não fossemos nós de transmissões e descodificações, bons a descobrir códigos.

    Encontrei o código e agora a gaja maluca que se ponha a pau. Quem manda agora é a minha Ana e eu vou tentando ajudar.

    Abração,
    Fred
    (n. Mec.º 00236086)

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  5. Obrigada. Este "obrigada" é muito pouco para exprimir o que senti quando li o teu post.Mas tu sabes o que senti.
    Agora, e para que conste, não quero cá abusos de intimidade com a outra, senão, nem sei... vou-me a ela e... nem sei!
    Amo-te, pronto.

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  6. Fabuloso.. tu vês como a gaija manhosa, eu é mais...tenho uma tatoo :)
    A sério que gosto dela, é porreira, ensinou-me a gostar mais de viver e apreciar as coisas que eu faço ... sim é verdade, posso já não ver muito bem os flamingos quando vou à ilha de Tavira mas ainda consigo caminhar da estação de comboio com a mochila de campismo para o barco e lá vou eu para o último paraíso algarvio :D
    A tatoo às vezes fica um bocadinho chata mas a malta dá-lhe uma atenção, um miminho e prontos, fica lindinha como eu gosto :D

    Um bjinho pa ti e prá Ana

    ... já agora passem mais vezes pelo meu cantito, não tenho lá bambu pra ti mas trato bem as visitas :D

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  7. Olá.
    Fiquei sem palavras e quase de rastos! Não nos conhecemos, mas sou amigo de um amigo e como ele diz "amigos dos meus amigos, meus amigos são".
    Força! Continuem com esse espírito.
    Gostei também do Abreijos e por isso repito. Abreijos, JF

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  8. É fantástico como as pedras que nos atingem são quase sempre iguais às que atingem grande parte dos adoradores e merecedores da vida.
    Nada de lamechices, mas que esta merda de aturar gajas que aparecem sem ser convidadas e que de repente querem ficar connosco para o resto da vida, tem muito que se lhe diga. Mas a malta explica-lhes como é que é.
    Já são muitos aninhos a virar frangos, e isto, é só mais um.

    Abreijos mais, para todos.

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  9. Grande Bina!! Eu mochilas, só mesmo no porta bagagens do carro. Qando chegásse ao parque bem podia ir dormir ara a praia que montar tendas, nem por isso...
    Abraço para ti e para todos os demais!

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  10. Panda,

    Muita força para vocês os dois. O teu espirito ajuda, acredita! Se precisares de alguma ajuda diz. Grita que a malta acorre.
    Teu leitor assiduo!

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  11. Não sei o que te dizer meu irmão, de tal forma é belo o teu texto e clara e simples a tua exposição. Estou prostrado e não estou a exagerar. Que "sorte" tem a Ana em ter-te a seu lado. Beijos, muitos beijos para ambos. E obrigado por partilhares. Desejo-te sorrisos Ana...

    Rui Freitas

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  12. Abreijos.

    A vida de vez em quando presenteia-nos com umas pedras pesadas ... eu, no meu caso utilizo-as opara cimentar e solidificar ainda mais as paredes do castelo que estou a construir.

    Thanks a todos, mas nada de lamechices ... SEX, DRUGS (just a few) and ROCK AND ROLL e siga. Já estamos como se diz, a metade da idade, ou quase. Há que aproveitar, com qualidade.

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  13. Li este artigo porque temos um amigo comum -JP- .
    Fiquei impressionada com a descrição e ao mesmo tempo com a coragem e a força que nos transmite.
    Continue assim, muita força gostei imenso.

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  14. Da minha parte um grande abraço e muita força para ultrapassaer as provações que vos esperam...

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  15. Parabéns.
    Sim, eu disse mesmo:Parabéns!
    Por conseguires tratar por tu uma doença como a EM e reduzi-la à "insignificância" que merece nas vossas vidas que são plenas de coisas verdadeiramente grandes e bonitas,aquelas que "só se conhecem com o coração" e que uma gaja feia, mal-educada e ainda por cima muito previsível (embora queira fingir que é imaginativa, mas vocês já lhe topam os truques todos...)nunca conseguirá abalar.
    Sobretudo porque, como dizes, usas as pedras para enraizar e robustecer os "edifícios" da vossa vida,que serão, hoje e sempre, inabaláveis.
    Parabens uma vez mais pelo que escreveste; é uma lição de vida.
    Parabéns pela pessoa que és - desde que me tornei tua leitora assídua aprendi a conhecer-te um pouco - e parabens à tua Ana, por tudo isso e mais ainda.

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  16. Obrigado pela tua força Teresa, obrigado.

    Mas tem que ser assim, aproveitar o vento, abrir as velas e seguir em frente, tem que ser.

    Beijinhos
    *****

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  17. Com amor é sempre menos complicado lidar com as partidas que a vida nos prega, e eu sei que és uma pessoa generosa.
    Desejo-vos muita força para o convívio com a nova “amiga”.
    Beijos para os dois.
    Abreijos (gostei desta palavra)

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  18. bom, nem sei que diga!
    ao ler estas palavras senti um arrepio! Talvez porque a minha história tem semelhanças...!
    Sou portadora de E.M.Força Panda e Ana.
    anamar- gateway

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  19. Anamar,
    A vida tem destas coisas e nós temos que ser capazes de esperar e depois saber lidar com o inesperado. Nem sempre é fácil, mas a amizade e a cumplicidade transformada em algo mais forte faz sempe com que tudo se transponha, ou melhor, quase tudo, mas em grande parte conseguimos. Temos que conseguir.
    Um beijinho para ti e keep on fiting.

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  20. Olá Panda, Ana, Anamar e todos vós cheios de luz com ou sem EM que conseguem vislumbrar este infortúnio, também eu fui escolhida para amiga desta matreira, deixei de lutar contra ela e começo a habituar-me e a tirar partido de tudo o que ela me fez ver... nesta procura na net encontrei-vos estrelinhas brilhantes, e fico feliz por saber quantas pessoas maravilhosas e inteligentes existem e quero agradecer e pedir que continuem porque temos uma vida para viver e somos especiais.
    Albertina

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