E o gajo que já morreu, em '42 chamava-as de Toleradas ...
E elas toleravam o termo e até se sentiam protegidas. Quem ousava cometer com estas jovens, ensaios de devaneios de pecados autorizados, sabia que estava a usufruir de um produto autenticado pelos Serviços de Inspecção de Toleradas. Portanto, era um pecado tolerado pela sociedade, deixava de ser pecado, era uma prestação de serviço.
Estas gentes que eram as toleradas, nem sequer sonhavam vir a ser os percutores do fantástico grau de contratação de trabalho - Prestador de Serviços -, criado no final do séc XX, e que agora prolifera no nosso burgo sem qualidade nenhuma, nem tão pouco com carta verde. Se as toleradas de hoje soubessem o bem que fariam em ficar em bordéis onde eram toleradas e podiam dormir sossegadas ... mas pronto, tá bem, só tinham que levar (como antigamente) de ve em quando com a jurássica idade dos então e agora também chamados de protectores, os homens bons da sociedade. Era assim que se chamava a quem pagava por ter um naco de carne com selo de garantia do estado novo, e podia pagar.
As protectoras das toleradas, eram toleradas e protegidas pelo "rebenta cadeiras". Eram protegidas por aquele a quem alguém com vontade de viver, ousava jamais dizer na altura o contrário do que ele decidia. Caso assim fosse, deixava de ser tolerado e era mandado borda fora, pró mar, encaminhado para as colónias, para lá então proliferar e com novo alento tentar ser tolerado.
Ora bem, hoje já ninguém se chama tolerada nem gosta de se sentir como tal. Tolerada hoje em dia é ser minimamente aceite, não gostarem assim tanto de nós, enfim, tolerar-se e pronto, deixa estar. O melhor mesmo é ser chamado de puta, isso sim ... "ah e tal e o que é que tu fazes?" " Eu?! Eu sou puta no intendente ... pruquê oooh?". Hoje é fino ser-se conhecida como puta, por exemplo: "olha-me aquela valente puta, que corpo filha da puta, fantástico, que mamas a cabrona tem, engraçada a rapariguita ehin??!! ...", ou, em conversas de gajas " ... bem miga, nem imaginas, hoje fui mesmo puta com o meu namorado , fiz-lhe uma das boas ...". Já imaginaram isto ser dito com a palavra tolerada em vez da palavra puta??!! Não tinha o arreganho que estas frases têm em ser ditas assim pois não??
O que interessa mesmo é saber se as putas são ou não são toleradas hoje, se podem vender o produto que sempre venderam mas com selo de garantia ... pode ser atestado pelo centro de saúde mais próximo sei lá, mas com cartita verdinha, ah, e juntá-las numa casita porreira, com águas quentes e correntes e tudo, isso é que era. Mas não pode ser pois os chulos perdiam guito à brava. As gajas entretanto, que se lixem, bem podem levar umas porradas e morrerem, o que interessa é o carcanhol.
O mesmo se passa, se bem que a semelhança não seja lá muito boa, com a classe de políticos por nós tolerada. Sim, porque nós toleramo-los (palavra lixada de se dizer), e consumimo-los (outra) a pensar que estão dentro da validade e são puros e não nos prejudicam a saúde. A vontade que dá é chamá-los mesmo de bois e podermos aviar-lhes umas valentes porradas naquelas molduras dentárias a ver se os animais se comportavam como verdadeiros action men, em vez de andarem aqui a chular-nos, isso é que era. Assim talvez os tolerássemos, molfdadinhos à nossa maneira, à maneira antiga, bem comportados.
A palavra tolerar, ou tolerada, quem sabe, até mesmo a palavra tolerância, se viesse a ter novamente o verdadeiro significado e, nos devolvesse a necessária paz de espírito quando disséssemos "oh páquele político de merda, só faz mesmo é merda ... mas tá bem, é tolerável, deixóstar.". Isso é que era. Mas são coisas que só o gajo, que contava também com os votos dos mortos, é que podia fazer, decidia, tá feito, não mexe, é assim, siga. E a malta ficava sossegada e era tolerante.
Agora, já não há gajos com tintins para decidir atribuir Cartas de Atestado Sanitário a seja quem for, agora, indiscriminadamente, tudo se tolera. E se chegasse alguém com vontade de o fazer, de mudar alguma coisita, deixava imediatamente de ser tolerado pela classe ocupadora da nossa Assembleia da República, os verdadeiros tolerados, a verdadeira portuguesa máfia tolerada.
Íamos lá nós tolerar uma coisa dessas!!! Não íamos, pois não??!! Ou íamos!!?? Não íamos ... nada disso ... mais mudanças ... dá muito trabalhinho, estas coisas toleram-se ...
O problema é que já não temos colónias para onde mandar os tolerados dos nossos políticos :))
ResponderEliminarE a "tolerância" até parece estar na moda. É assim como: "Mas é ilegal?" "Sim!" "E pode fazer-se?" "Sim." "E o que é que acontece?" "Nada" "Mas é ilegal?" "Sim"...
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